Levando o sonho comigo para 2023
- Carolina Germana
- 6 de jan. de 2023
- 4 min de leitura

Sento-me ao pé da cascata a ouvir o som da água a cair e a correr rio abaixo entre pedregulhos. É o som predominante neste bocadinho do dia de hoje que escolhi dedicar a mim. Abaixo do meu queixo tenho a cabeça do meu bebé, que respira lentamente no seu sono profundo, enrolado no pano que uso para o transportar colado ao meu peito. Finda esta época festiva, estava a precisar de pausa. Eu e o M.. Voltar a estar um pouco a sós e em contacto com a natureza em silêncio, para reequilibrar energias e nos conectarmos um ao outro novamente. Não me interpretem mal. Teria ficado mais tempo na ilha, se assim fosse possível. Rodeada de familiares e de outros colos para o M., que me deram imensa mão. Envolta em mar, debaixo de sol e aninhada no calor de inverno que só se faz sentir naquela pérola do Atlântico. Mas a época natalícia é agitada e desregula-nos os sonos e também as vontades. Voltei recentemente para aquela que é agora a nossa casa enquanto família de três, inserida numa quinta rodeada de vinhas e cavalos, com o Simba e a Sasha a correrem livres pelos relvados e com trilhos que nos levam a sítios maravilhosos. É pena o frio que faz gelar as mãos e o nariz, mas pelo menos o sol que apareceu nestes primeiros dias tem tornado menos difícil o regresso. Levámos pela primeira vez o nosso filho ao nosso lar a meados de dezembro, ainda sem ter completado dois meses de vida e com muitos planos para os dias lá presentes. Ansiosos para que conhecesse o mar e estar com as pessoas que nos são queridas, sabendo que ia ser um natal diferente.
Um natal com um bebé de sorriso fácil e bem disposto, que cativou um bocadinho de todos os que connosco se cruzaram. Mas também com um choro gritado e aflitivo, a exigir cuidados acrescidos de quem veio ao mundo com uma doença tratável, mas incomodativa, que nos limitou um pouco o à vontade de estar fora. Choro que muitas vezes me deixou desorientada a ouvir este coração sofrer... por dor, por sono, por excesso de estímulo, por fome, por.... Muitas vezes fiquei sem perceber porquê.
Foi um natal de muito colo. Não só meu e do pai. Também e especialmente dos avós e dos tios, a quem só tenho a agradecer a paciência e o carinho, enquanto eu aprendia a tê-los à minha volta já não só como pais, irmãos, cunhados ou sogros. Também eles a aprenderem a ser família do M.. Também eles a aprenderem a lidar comigo neste novo papel.
Um natal em que por vezes chorei de cansaço e frustração, tal a exigência de um bebé. Mas também chorei de alegria. Porque o pós parto parece-me ser isto mesmo. Os dias e noites mal se distinguem e as emoções rolam de um extremo a outro com facilidade, culminando por vezes em explosão do coração e da razão. Um natal em que fui mais difícil, em que estive menos disponível para os outros e em que esgotava todas as minhas energias para me manter de pé nas mil e uma atividades e convívios próprios da época.
Um natal sem grandes saídas noturnas ou muitos convívios entre amigos, resguardando-nos mais no seio familiar. A vontade era pouca ao final do dia, em que me sentia exausta e pronta para aproveitar os sonos do M. para dormir também, sabendo que ia acordar pouco depois, de novo. Ainda consegui jantar fora com amigas, deixando o M. com o pai e mais tarde para uma escapadinha com o A., o M. ficou com os avós paternos e leite materno extraído, com oportunidade de me embonecar em vestido de gala, sapato alto e dar um pezinho de dança. Ainda que sempre a pensar regressar para o colo do meu bebé. Ou deveria ser ele a voltar para o meu? Foram muitas as noites passadas junto ao janelão de casa de onde de dia se vê o mar e de noite se veem as estrelas. A observar a lua esconder-se por detrás da montanha. Ele embalado pela minha voz entoando canções que vou buscar à minha infância ou por entre palavras que me saem no momento e que o tranquilizam de alguma forma. Eu abraçada a ele até que embarcasse de novo no mundo dos sonhos. Foi um natal diferente. Em que várias vezes fiquei só a adorar o meu bebé sorridente no muda fraldas que me devolvia um olhar fixo com os seus olhos azuis cor de mar. Em que dialoguei por sorrisos e vocalizações várias enquanto me perguntava vezes sem conta se é mesmo minha esta perfeição e como é que tive esta sorte.
Foi um natal mais cheio de tudo. E em que me senti mais preenchida que nunca. Entrei em 2023 com o meu bebé nos braços, a ver o fogo de artifício rebentar ao longo da baía do Funchal. Para mim este é sempre um momento emotivo e de reflexão. Escusado será dizer que me esvaí em lágrimas, agarrada ao que tinha sido o meu maior desejo de 2022. Ser mãe. Pelas quatro e pouco da manhã, já no sofá de casa, amamentava ao som da chuva que se fazia cair depois de dias e dias de sol na ilha. Olhava o número 2023 que assenta em quem olha para o Cabo Girão. Com o M. de fralda apenas, aninhado no meu peito (é o que permitem as temperaturas amenas da nossa Madeira), sentia-lhe a pele suave e fazia-lhe festas, para que aquela sensação me fizesse cair a ficha de vez. Sim, é real. Levo comigo este sonho para o ano seguinte. O sonho de ser mãe. Levo-te a ti, meu doce filho de olho vivo arregalado, para te acompanhar, cuidar, tratar, educar e amar ao longo de 2023 e para o resto das nossas vidas.
06-01-2023 CroniCalinas
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